Teatro das Oprimidas, por Bárbara Santos
A inegável conquista das mulheres por direitos e mais participação em instâncias de poder, não tem sido suficiente para impedir que milhares de mulheres, no mundo inteiro, continuem sendo vitimadas pela violência machista: doméstica e social, física e emocional. Além de, freqüentemente, carregarem a vergonha e a culpa por suas tragédias. Isso dificulta a percepção de que o que se passa com cada uma dessas mulheres não é nem particular nem natural.
O Teatro das Oprimidas é resultado da necessidade de desenvolver produções teatrais, nas quais as mulheres não sejam culpabilizadas pelas violências machistas que enfrentam, e de ampliar a participação de artistas-ativistas como facilitadoras desses processos de produção e do diálogo com o público nas sessões de Teatro Fórum, uma das técnicas mais praticadas do Teatro do Oprimido, método criado por Augusto Boal.
Por um lado, o Teatro das Oprimidas aprofunda a perspectiva subjetiva do problema para explicitar a complexidade das personagens e, por outro lado, prioriza a inclusão da estrutura social na encenação, a fim de revelar os mecanismos de opressão que sustentam o sistema patriarcal.
Se o Teatro do Oprimido representou uma revolução na forma de conceber e implementar o fazer teatral, o Teatro das Oprimidas constitui a revolução dentro da revolução. Uma metodologia que surgiu de dentro de outra metodologia para aprofundá-la, ampliá-la e também para questioná-la.
No Teatro das Oprimidas não se questiona apenas o caráter singular e masculino “do Oprimido”, busca-se a superação da abordagem individualista na representação cênica por meio da problematização do contexto social que limita (e muitas vezes impede) as escolhas pessoais das oprimidas.
Nesse sentido, o Teatro das Oprimidas, como processo estético e político, relativiza a importância dos comportamentos individuais na encenação, a fim de jogar luz nas variáveis que interferem na situação, independente das decisões particulares da protagonista. Nossa metodologia de trabalho visa desenvolver a perspectiva artística e a abordagem estrutural em produções teatrais, por meio de estéticas feministas.
O Teatro das Oprimidas instaura espaços para o questionamento da imposição de uma forma padronizada de ser. Espaços que possibilitem a abertura das receitas herdadas de “boa menina”, “boa moça”, “boa dona de casa”, “boa mãe”…, que continuam a repercutir e a influenciar a vida cotidiana. No Teatro das Oprimidas, propomos a invenção de fórmulas improváveis e a celebração da ousadia das que foram chamadas de bruxas e punidas por se rebelarem contra a negação de suas existências. A metodologia estimula o estabelecimento da confiança mútua e o exercício da solidariedade para a superação da culpa, da vergonha e da competição, com vistas ao enfrentamento do silêncio que oculta temas tabus. No Teatro das Oprimidas, lutamos para estabelecer um território de empoderamento, em que tanto fraquezas, inseguranças, erros e medos, quanto potencialidades, sonhos e descobertas possam ser compartilhados sem restrições.
As participantes se sentem encorajadas a contar suas histórias por perceberem que estas são quase como ecos de histórias alheias. Um processo que potencializa sororidade, por meio da escuta de suas próprias palavras na voz da outra; da percepção de si na declaração de identidade da outra; da auto-imagem na pintura da outra; e no reencontro do sonho esquecido no poema da outra. Aproximação que facilita a compreensão coletiva das complexidades emocionais e dos contextos sociais que englobam e reforçam essas opressões.
A abertura desses espaços propiciou o contato com algo de ancestral que nos ajudou a abrir portas fechadas de uma identidade obscurecida e sufocada pela imposição de modelos autoritários e inflexíveis. Um espaço de tempo com liberdade para nos vermos (eu-nós) e investigarmos imagens, contradições e concessões. Espaço de compreensão e, ao mesmo tempo, de crítica, onde nos despimos das vítimas e nos assumimos sobreviventes: oprimidas em busca de transformação que se convertem em ativistas.
Com a expansão dos processos de multiplicação, a experiência chegou a Guiné-Bissau, Moçambique, Portugal, Alemanha, Estados Unidos, Guatemala, Argentina, Uruguai, Chile, Nicarágua, Equador, Costa Rica, Venezuela, Bolívia, Colômbia, México, Itália, Espanha, Suíça, França, Hungria, Polônia, Índia, Nepal e Argélia com grupos feministas de defesa dos direitos das mulheres. Esse processo deu origem a uma rede internacional.
O Teatro das Oprimidas é resultado da necessidade de desenvolver produções teatrais, nas quais as mulheres não sejam culpabilizadas pelas violências machistas que enfrentam, e de ampliar a participação de artistas-ativistas como facilitadoras desses processos de produção e do diálogo com o público nas sessões de Teatro Fórum, uma das técnicas mais praticadas do Teatro do Oprimido, método criado por Augusto Boal.
Por um lado, o Teatro das Oprimidas aprofunda a perspectiva subjetiva do problema para explicitar a complexidade das personagens e, por outro lado, prioriza a inclusão da estrutura social na encenação, a fim de revelar os mecanismos de opressão que sustentam o sistema patriarcal.
Se o Teatro do Oprimido representou uma revolução na forma de conceber e implementar o fazer teatral, o Teatro das Oprimidas constitui a revolução dentro da revolução. Uma metodologia que surgiu de dentro de outra metodologia para aprofundá-la, ampliá-la e também para questioná-la.
No Teatro das Oprimidas não se questiona apenas o caráter singular e masculino “do Oprimido”, busca-se a superação da abordagem individualista na representação cênica por meio da problematização do contexto social que limita (e muitas vezes impede) as escolhas pessoais das oprimidas.
Nesse sentido, o Teatro das Oprimidas, como processo estético e político, relativiza a importância dos comportamentos individuais na encenação, a fim de jogar luz nas variáveis que interferem na situação, independente das decisões particulares da protagonista. Nossa metodologia de trabalho visa desenvolver a perspectiva artística e a abordagem estrutural em produções teatrais, por meio de estéticas feministas.
O Teatro das Oprimidas instaura espaços para o questionamento da imposição de uma forma padronizada de ser. Espaços que possibilitem a abertura das receitas herdadas de “boa menina”, “boa moça”, “boa dona de casa”, “boa mãe”…, que continuam a repercutir e a influenciar a vida cotidiana. No Teatro das Oprimidas, propomos a invenção de fórmulas improváveis e a celebração da ousadia das que foram chamadas de bruxas e punidas por se rebelarem contra a negação de suas existências. A metodologia estimula o estabelecimento da confiança mútua e o exercício da solidariedade para a superação da culpa, da vergonha e da competição, com vistas ao enfrentamento do silêncio que oculta temas tabus. No Teatro das Oprimidas, lutamos para estabelecer um território de empoderamento, em que tanto fraquezas, inseguranças, erros e medos, quanto potencialidades, sonhos e descobertas possam ser compartilhados sem restrições.
As participantes se sentem encorajadas a contar suas histórias por perceberem que estas são quase como ecos de histórias alheias. Um processo que potencializa sororidade, por meio da escuta de suas próprias palavras na voz da outra; da percepção de si na declaração de identidade da outra; da auto-imagem na pintura da outra; e no reencontro do sonho esquecido no poema da outra. Aproximação que facilita a compreensão coletiva das complexidades emocionais e dos contextos sociais que englobam e reforçam essas opressões.
A abertura desses espaços propiciou o contato com algo de ancestral que nos ajudou a abrir portas fechadas de uma identidade obscurecida e sufocada pela imposição de modelos autoritários e inflexíveis. Um espaço de tempo com liberdade para nos vermos (eu-nós) e investigarmos imagens, contradições e concessões. Espaço de compreensão e, ao mesmo tempo, de crítica, onde nos despimos das vítimas e nos assumimos sobreviventes: oprimidas em busca de transformação que se convertem em ativistas.
Com a expansão dos processos de multiplicação, a experiência chegou a Guiné-Bissau, Moçambique, Portugal, Alemanha, Estados Unidos, Guatemala, Argentina, Uruguai, Chile, Nicarágua, Equador, Costa Rica, Venezuela, Bolívia, Colômbia, México, Itália, Espanha, Suíça, França, Hungria, Polônia, Índia, Nepal e Argélia com grupos feministas de defesa dos direitos das mulheres. Esse processo deu origem a uma rede internacional.
Rede Ma(g)dalena Internacional:
Nas primeiras experiências, nos reunimos para investigar se seria mais fácil falar de nossos silêncios estando entre mulheres. Nesse ambiente, nossas vozes soaram melhor. Incrível a experiência de poder se expressar, ao mesmo tempo, com força e com suavidade. Mágico escutar a própria voz nas histórias alheias. Enfrentar o silêncio em coletivo fez todo o sentido.
O forte interesse despertado pela experiência, seus resultados e suas descobertas foram o impulso necessário para avançar. Não havia mais como retroceder. Cruzamos fronteiras e nos aproximamos de outras, que multiplicaram e transformaram nossa imagem. Nos tornamos muitas mais.
Criamos espaços de partilha e nos transformamos em uma Rede Internacional, a fim de ampliarmos o volume de nossas vozes, a visibilidade de nossa luta e a possibilidade de atuação articulada. Para aprofundar as descobertas, organizamos encontros e seminários internacionais no Rio de Janeiro, Berlim, Buenos Aires, La Paz, Matagalpa, Barcelona e Montevidéu. Nos olhamos umas às outras e nos questionamos sobre o porquê e o para quê seguir adiante… juntas! A muitas mãos, escrevemos um manifesto para expressar quem somos, o que fazemos e o que queremos.
Sentimos a necessidade de avançar também na produção artística e realizamos dois festivais internacionais, a primeira edição, em 2015, em Puerto Madryn, Patagônia Argentina e, em 2017, em Berlim, Alemanha.
Estamos em coletivos articulados a organizações e movimentos. Somos múltiplas e diversas. Somos um movimento de artistas-ativistas. Buscamos analisar e entender as especificidades das opressões que enfrentamos em intersecção com as demais opressões. Implementamos ações políticas concretas, através de nossa estética feminista, que visam a superação da violência machista, da exploração capitalista e do sistema patriarcal.
Nas primeiras experiências, nos reunimos para investigar se seria mais fácil falar de nossos silêncios estando entre mulheres. Nesse ambiente, nossas vozes soaram melhor. Incrível a experiência de poder se expressar, ao mesmo tempo, com força e com suavidade. Mágico escutar a própria voz nas histórias alheias. Enfrentar o silêncio em coletivo fez todo o sentido.
O forte interesse despertado pela experiência, seus resultados e suas descobertas foram o impulso necessário para avançar. Não havia mais como retroceder. Cruzamos fronteiras e nos aproximamos de outras, que multiplicaram e transformaram nossa imagem. Nos tornamos muitas mais.
Criamos espaços de partilha e nos transformamos em uma Rede Internacional, a fim de ampliarmos o volume de nossas vozes, a visibilidade de nossa luta e a possibilidade de atuação articulada. Para aprofundar as descobertas, organizamos encontros e seminários internacionais no Rio de Janeiro, Berlim, Buenos Aires, La Paz, Matagalpa, Barcelona e Montevidéu. Nos olhamos umas às outras e nos questionamos sobre o porquê e o para quê seguir adiante… juntas! A muitas mãos, escrevemos um manifesto para expressar quem somos, o que fazemos e o que queremos.
Sentimos a necessidade de avançar também na produção artística e realizamos dois festivais internacionais, a primeira edição, em 2015, em Puerto Madryn, Patagônia Argentina e, em 2017, em Berlim, Alemanha.
Estamos em coletivos articulados a organizações e movimentos. Somos múltiplas e diversas. Somos um movimento de artistas-ativistas. Buscamos analisar e entender as especificidades das opressões que enfrentamos em intersecção com as demais opressões. Implementamos ações políticas concretas, através de nossa estética feminista, que visam a superação da violência machista, da exploração capitalista e do sistema patriarcal.
Bárbara Santos (Rio de Janeiro, Brasil). É uma das idealizadoras e principal difusora do Teatro das Oprimidas. A autora é fundadora e referente artístico-metodológico da Rede Ma(g)dalena Internacional, composta por grupos feministas da América Latina, Europa, África e Ásia. No Brasil, atua como consultora do Centro de Teatro do Oprimido, editora da revista METAXIS e como diretora artística do grupo Cor do Brasil e do Coletivo Madalena-Anastácia. Bárbara tem 29 anos de experiência ininterrupta com o Teatro do Oprimido, em mais de 40 países. É autora de Teatro do Oprimido, Raízes e Asas: uma teoria da práxis, lançado em português, 2016 (Ibis Libris); em espanhol, 2017 (Descontrol Editorial); em italiano, 2018 (Clueb) e em inglês, 2019 (UCLA). A nova edição de Raízes e Asas, 2019, em português, sai pela Casa Philos. O segundo livro da autora Percursos Estéticos: abordagens originais sobre o Teatro do Oprimido foi lançado em português, 2018 (Padê editorial). Bárbara Santos vive na Alemanha desde 2009, onde é diretora artística de KURINGA – espaço para o Teatro do Oprimido em Berlim e do grupo Madalena-Berlim. Idealizadora e coordenadora do Programa KURINGA de Qualificação em Teatro do Oprimido, que teve avaliação externa da Universidade de Bologna, integra a ITI Alemanha, o Instituto Internacional de Teatro da UNESCO.
Como autora e diretora, tem se destacado por produções artísticas que abordam temas contextuais (capitalismo, racismo, machismo, migração, etc.) e pela pesquisa de formatos coletivos para a intervenção da plateia no Teatro Fórum. Como atriz, fez Filomena, no filme A Vida Invisível de Eurídice Gusmão, de Karim Ainouz, ganhador do Grand Prix de Melhor Filme, da mostra Un Certain Regard, do Festival de Cannes de 2019. Como performer, em Travessia, investiga a conversão do corpo cênico em corpo político.
Como autora e diretora, tem se destacado por produções artísticas que abordam temas contextuais (capitalismo, racismo, machismo, migração, etc.) e pela pesquisa de formatos coletivos para a intervenção da plateia no Teatro Fórum. Como atriz, fez Filomena, no filme A Vida Invisível de Eurídice Gusmão, de Karim Ainouz, ganhador do Grand Prix de Melhor Filme, da mostra Un Certain Regard, do Festival de Cannes de 2019. Como performer, em Travessia, investiga a conversão do corpo cênico em corpo político.